sábado, 30 de maio de 2009

POEMA SOBRE O CERRADO

Poema de Tonicato Miranda


O CERRADO QUE NÃO MAIS SE VÊ

escuta aqui, almofadinha

não se engane a cidade já foi campo

ele agreste quase não mais se vê

já houve tempo, já houve vento

terra causticante, sol a pino, sede de ceder

rodamoinho com nome de lacerdinha

Brasília cercada de cerrado tinha

o cerrado tinha jacupemba, andorinha tinha

pequi pra toda parte, fruta no pé e no chão

árvores retorcidas, mais de um milhão

cobra couro de arte, buriti nos brejos, tinha

muitos corguinhos de água limpinha

moça se banhando na cacimba

a gente olhando lá de cima, como tinha

lobo guará, ema, seriema, tatu bola tinha

gavião, coruja, sucuri, lebres saltadoras

veado campeiro, formigas de fogo e as voadoras

araticum, ameixa brava, belas plantinhas, tinha

casa de barro plantada no morro alto

cavalo sem cilha e um pouco de asfalto

tudo isto quase não tem, já teve, tinha

bando de papagaios no rumo dos guabiruvus

peixes coloridos no remanso de rio pequeno

bem-te-vi te vi tão grande, te vi tão pequeno

bem-te-vi, mal te vi, já todo te senti, você tinha

tantas informações, cadê os sanhaços

será gato do mato comeu-os manhãzinha

cortaram os paus e tocos, mataram a matinha

cerrado, muita velha curandeira tinha

ervas-remédio, ervas de cheiro, ervas sozinhas

alguns índios caçavam aqui, céus sobreviventes

malocas perdidas nos cantos das vertentes

muito cristal de rocha e esmeralda tinha

e um pôr-do-sol colorindo nos fins de tarde

prostrado, velho caboclo, saudades da Ritinha

o cerrado tinha

seriemas, emas, cobras

assovio na mata tinha

fruta azeda, fruta doce

camaleão na pedra

jacaré no brejo tinha

susto do pacu

tinha pio de nhambu

lagartas nas folhas

lagartas no chão

asfaltos distantes tinha

cachorros no mato

carros no céu

carros sobre a cobra

brilho do sol na latinha

morros sorrisos

montanhas de veludo

e uma montanha

que só eu tinha

FONTE:http://palavrastodaspalavras.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário